Transformação das Algas em Recursos Sustentáveis
As algas, que desempenham um papel crucial na produção de oxigênio do planeta, são frequentemente vistas como resíduos nas praias. Sem raízes, elas se desprendem facilmente e são levadas pelas ondas para a areia, onde muitas vezes são confundidas com lixo. Esse fenômeno gera desconforto entre os frequentadores das praias e a imagem negativa das arribadas, ou simplesmente, sargaços, que invadem as faixas de areia.
Contudo, fora do ambiente marinho, essas algas apresentam um potencial promissor como recursos renováveis, especialmente na agricultura. Este uso inovador já está sendo alvo de diversas pesquisas ao redor do globo. Reconhecida pela Organização das Nações Unidas (ONU), a Economia Azul propõe uma exploração sustentável dos oceanos, destacando que eles podem fornecer soluções para a transformação econômica e ambiental do planeta.
A vice-secretária-geral Amina J. Mohammed, durante a Conferência Internacional sobre Economia Azul no Golfo da Guiné, ressaltou a poluição dos mares e a destruição dos recifes de corais, mas também indicou que a solução pode estar escondida nas águas oceânicas.
Concentração de Sargaços em Alagoas
Em Alagoas, a professora Élica Guedes, da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), observa que os sargaços estão particularmente concentrados nas praias que possuem recifes, como as de Maceió, onde os turistas frequentemente encontram essas algas. Com destaque para as praias de Ponta Verde, Riacho Doce e Pajuçara, a situação é a mesma em Japaratinga, no Litoral Norte do estado.
Mayara Jatobá, proprietária de um comércio próximo ao Marco dos Corais, comenta que a presença das algas afeta o movimento de clientes. “Isso causa um certo incômodo, pois remete à sujeira. Turistas que não conhecem a região perguntam se a praia é adequada para banho, e o cheiro é bastante forte”, relata.
Percepção Errônea e Educação Ambiental
Élica Guedes defende que as algas não devem ser vistas como sujeira, mas sim como componentes naturais dos oceanos. Ela explica que o odor forte é resultado da decomposição da matéria orgânica, o que é comum nas interações marinhas. “Esse fenômeno é parte integrante da biodiversidade marinha e vai continuar a existir, independentemente da nossa percepção”, afirma.
Um projeto inovador da startup alagoana Proalga Biotech, em colaboração com instituições de pesquisa e apoio da Fapeal, será iniciado em breve em Maceió. O projeto visa a criação de núcleos integrados para o beneficiamento e biorrefinamento de macroalgas marinhas, com o objetivo de produzir e comercializar produtos sustentáveis a partir dessas biomassa.
O Potencial dos Bioinsumos
Bruno Soares, biólogo e cofundador da Proalga, destaca que os bioinsumos derivados de algas têm um grande potencial na agricultura orgânica e na horticultura de alto valor. “Essas algas são ricas em nutrientes essenciais, como nitrogênio, fósforo e potássio, além de micronutrientes que favorecem o crescimento das plantas”, explica.
Os extratos de algas são eficazes em aumentar a produtividade e a qualidade das culturas, além de fornecer moléculas que ajudam a ativar as defesas das plantas, reduzindo a necessidade de pesticidas. A Proalga está empenhada em estabelecer rotas de produção que sejam ecologicamente sustentáveis, desde a coleta até a elaboração de insumos destinados ao mercado.
Desafios na Coleta e Sustentabilidade
Apesar do potencial, Élica Guedes enfatiza que a escalabilidade do uso das algas enfrenta o desafio da coleta, tanto no mar quanto na praia. A remoção de algas do oceano sem cultivo não é viável, já que elas são importantes produtoras de oxigênio. O recolhimento, muitas vezes realizado com máquinas, acaba levando areia e outros materiais pela borda da praia. Atualmente, a Prefeitura de Maceió faz a remoção conforme a demanda, levando as algas para aterros sanitários.
“Já vi casos em que as algas foram retiradas e levadas para produtores de minhoca, mas muitas vezes havia mais areia do que algas. Nosso desafio é encontrar uma forma de coletar as algas sem danificar a areia e o ecossistema”, explica Élica.
Iniciativas em Outras Regiões do Brasil
Outras iniciativas estão surgindo pelo Brasil, como a Cia das Algas, situada em Trairi (CE), que já utiliza sargaços de forma sustentável para criar produtos cosméticos e insumos agrícolas. Cientistas do Instituto Federal do Espírito Santo também estão fazendo avanços, desenvolvendo soluções que transformam algas em adubos agrícolas, utilizando um “suco” rico em nutrientes para borrifar em plantas e solos.
Essas iniciativas mostram que o caminho para uma economia mais sustentável pode muito bem passar pelas algas, que frequentemente são vistas apenas como um incômodo nas praias.