Desmistificando a Relação entre Paracetamol e Autismo
Pesquisas científicas não corroboram a afirmação de que o paracetamol durante a gestação está ligado ao autismo. Recentemente, uma declaração do ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que fez referência ao uso do Tylenol (nome comercial do paracetamol nos EUA), trouxe à tona esse tema, gerando uma onda de buscas no Google Trends. Para a neuropsicóloga Fabiana Lisboa, especialista na área, essa desinformação representa um perigo significativo.
Fabiana explica que o estudo mencionado por Trump carece de fundamentos científicos robustos. “É uma pesquisa que apenas correlaciona dados, mas não estabelece uma relação de causa e efeito. Portanto, não possui o rigor necessário para essa conclusão”, disse.
Ela ainda destaca que, em 2024, uma pesquisa realizada na Suécia, que acompanhou milhões de crianças, refutou a possibilidade de uma ligação entre o uso do paracetamol e o desenvolvimento do autismo.
“Esse estudo é notado por seu rigor científico e demonstrou que, ao comparar irmãos que foram expostos e não expostos ao medicamento, não houve evidência de risco claro. As associações observadas em análises menos rigorosas podem ser devidas a fatores genéticos e familiares”, acrescenta.
A Perigosa Desinformação
Fabiana também ressalta que o sensacionalismo das manchetes contribui para a propagação de informações equivocadas. Mesmo quando um aumento é observado em dados estatísticos, esse incremento é muitas vezes irrelevante em termos absolutos.
“É alarmante ver manchetes que afirmam que ‘o paracetamol causa autismo’, quando, na verdade, as informações disponíveis mostram apenas uma correlação fraca ou circunstancial”, alerta a especialista.
Outro ponto importante mencionado por Fabiana é a necessidade de esclarecer que vacinas não provocam autismo e que a condição não é resultado de condições parentais ou falta de afeto. “Essa ideia já foi amplamente desmentida. O autismo é um transtorno multifatorial”, defende.
Alterações no Rótulo do Medicamento
No mesmo dia da declaração de Trump, o FDA (Food and Drug Administration), agência regulatória dos EUA, anunciou que enviará orientações aos médicos com recomendações sobre o uso do paracetamol durante a gravidez. Segundo o ex-presidente, a diretriz sugere que mulheres grávidas devem restringir o uso do Tylenol, exceto quando estritamente necessário.
Embora o FDA tenha reafirmado que a relação causal entre paracetamol e autismo não está comprovada, a agência informou que a bula do medicamento será alterada. Marty Makary, comissário do FDA, afirmou que isso busca aumentar a consciência sobre os potenciais riscos associados ao uso de paracetamol na gestação.
Influência das Mudanças na Percepção Pública
A farmacêutica Dra. Mariana Oliveira observa que as modificações nas bulas podem ter dois efeitos antagônicos sobre a sociedade. O primeiro é criar a impressão de que o medicamento nunca foi seguro, gerando insegurança em quem já o utilizou. O segundo é fomentar o pânico, muitas vezes alimentado pela mídia.
“Comunicações eficazes e claras, feitas por profissionais de saúde como farmacêuticos, podem até reforçar a confiança na utilização do medicamento. No entanto, conclusões precipitadas oriundas de estudos limitados geram uso inconsistente, abandono de tratamentos e até a troca por alternativas menos seguras”, alerta Mariana.
Ela enfatiza que todos os medicamentos têm seus riscos e benefícios, e alterações nas bulas podem ser necessárias para garantir a segurança do paciente. “Essas mudanças não devem alimentar rumores ou resistência ao uso. Na dúvida, sempre consulte um farmacêutico”, recomenda.
Buscando Informações Confiáveis
Com a proliferação de fake news, Mariana salienta a importância de recorrer a fontes confiáveis. É fundamental buscar a orientação de profissionais que compreendem as nuances do medicamento. “Farmacêuticos conhecem o mecanismo de ação, os efeitos colaterais e sabem interpretar pesquisas científicas. Eles são os mais preparados para oferecer informações seguras sobre o uso de medicamentos”, afirma.
Além disso, mesmo medicamentos de venda livre, como o paracetamol, requerem atenção e aconselhamento profissional. “O local apropriado para obter medicamentos é a farmácia, onde o farmacêutico pode esclarecer dúvidas sobre uso, riscos e interações. Esse acompanhamento é essencial, especialmente para medicamentos que, à primeira vista, parecem inofensivos”, destaca.
Gestantes e o Cuidado Necessário
Para as gestantes, a precaução deve ser ainda maior. Mariana explica que elas fazem parte de um grupo de risco ao utilizar medicamentos e que todo tratamento deve ser supervisionado por um médico.
O ideal é que as gestantes também tenham acompanhamento farmacêutico, que pode fornecer orientações sobre o uso adequado do medicamento e encaminhar para avaliação médica quando necessário. Ela alerta que febres altas durante a gravidez podem ser prejudiciais ao bebê, tornando a consulta a profissionais de saúde uma etapa crucial na tomada de decisões. “O farmacêutico pode oferecer segurança às gestantes, ajudando a determinar quando o uso do paracetamol é apropriado e quando é necessário procurar assistência médica”, conclui.